terça-feira, 4 de setembro de 2012

Epitáfio

Epitáfio
 De onde vem tamanha inspiração?”, perguntava ela para mim. Mas a pergunta não tem resposta. Eu me lambuzo com as letras, danço com elas. As letras me chamam, e chamam as palavras. E as palavras me cutucam. E eu procuro acomodá-las. Fico sem pressa quando escrevo, sem vontade de que acabe o dia. E vou escrevendo, escrevendo, até não caber mais nada em mim. Até os meus ouvidos ficarem cheios do chiado das letras se arrastando pelo papel. E elas, as letras, dançam, de mãos dadas, vocalizando, não por serem vogais ou consoantes, mas por que se casam e se divorciam com as ideias com uma naturalidade atroz...
“Mas deve vir de algum lugar”. Eu não penso de onde vem, nem sei se vem de algum lugar. Vem do recostar na minha poltrona, do olhar pela janela do ônibus, da indignação momentânea, daquilo que é pleno, mas não satisfaz. Conjunção de gostos, duvidosos ao paladar alheio, eu cortejo as palavras, e as palavras são as penas do meu travesseiro. Melancólica sintonia, petulante dedução, escrevo, mordo minhas canetas, escrevo mais, até em minhas mãos... Não fico mais preso, voo enfim... Além, para longe, inclusive de mim... 
         “Por quê?” E por que não? Por que não? Ninguém fica depois que as luzes se apagam. Só as palavras, sobre o que ficou da gente. E eu quero conhecê-las melhor, estes seres mutáveis, incapazes de serem sós, e tão densas, como a névoa de uma manhã gelada. Que nada, não deixarei de escrever... Até o final da linha que o tempo me faz trilhar... Até o dia em que eu morrer.

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