sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Antes do Papai do Céu chamar...

  Antes do Papai do Céu chamar
  Foi conversa de canto de mesa, nem papo cabeça, nem prosa para o tempo passar. Foi mesmo a vontade doida de falar de tantas coisas, do tempo que foi e não mais vai voltar. É que nem aquela sobremesa, sobremesa que só a avó da gente sabe preparar. Ela pode deixar a receita, mas é só na casa dela que a gente vai encontrar.
- Então, o que você mais gostaria de fazer se soubesse que amanhã o Papai do céu iria te chamar?
- Nossa, tantas coisas passam pela minha cabeça. Você tem papel aí para anotar?
- Cabe tudo em dia? Porque se não cabe, nem adianta falar.
- Então, eu só teria mais um dia, um dia antes do “dia” chegar?
- Sim. E não adianta querelar. Decida-se! Vamos, trate de falar!
  Pensei, puxei a xícara para o meu lado. Senti o cheiro do café, fiz despertar lembranças. É necessário chamar a criança que existe na gente para responder a uma coisa dessas. A gente cresce nas memórias das nossas infâncias. Somos resultado de um baile de pernas que se encompridam e de um tempo que parece nos sufocar.
- Me encontraria com os meus irmãos, pediria para minha mãe preparar coisas que a gente não enjoava de degustar. Arranjaria uma caixa de papelão, daquelas que embrulham geladeira, iríamos para a beira da escada. Escorregaríamos. E nos cansaríamos de tanto brincar.
  Depois, sentaria com o meu pai. E contaríamos da vida e do tempo que se foi, do que é, e do que vai chegar. E o ouviria dizer (porque pai diz isso) “quando eu tinha a sua idade...”. E saberia reconhecer que é das lembranças que um pai conta para um filho que a vida não termina, mesmo quando ela insiste em acabar. E beijaria meus primos, meus amigos, minhas tias. E diria para a minha mãe o quanto a amo e como ela é linda e como me faz acreditar.
  E depois de tudo isso, e como se sobrasse muito tempo (porque sempre dá tempo), iria até os braços da minha avó, pediria aquela sobremesa e deixaria sobre a mesa uns versos para ela nunca se esquecer do quanto é lindo sentar-se ao seu lado.
  E no final, e junto, como junto estou, pegaria nas mãos da minha companheira e diria. “Vamos! O tempo é nosso! E o tempero é o amor!”. E sempre dá tempo para amar... Agora sim, Papai do Céu: pode me levar!


quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Dias assim

Dias assim
Quando amanhece
E a luz entra pela janela
E a gente descobre que o dia
Nem pede
Para a gente levantar
Dá uma vontade doida de ficar

Quando a gente sente o cheiro
E o beijo
De quem a gente ama
De quem a gente escolheu para abraçar
E o quarto vira o prato
O melhor retrato
E a vontade louca de continuar

E logo vem outro dia
Todos os dias
Benditos dias
E o Sol a raiar
Então,
a gente pensa
São dias assim
Que fazem ser simples
Que justificam o despertar...

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Ouvindo a minha avó

Ouvindo a minha avó
Há coisas que só o tempo diz
E o tempo diz
Porque as pessoas encontram tempo para perguntar
E as respostas levam tempo
Porque leva tempo para cultivar
Um chão de amores e sabores
Regado pelas mãos de lavradores
Que plantam tempo
Para que a gente encontre
Tempo para amar

Eu me sentei com a minha avó
E perguntei
“E quando o tempo acabar?”
E ela me ensinou que o tempo não acaba
A gente é que começa a recontar...