sexta-feira, 4 de abril de 2014

Mundo Solidão

Mundo Solidão
Lugar nenhum e todos eles, 16 de outubro de 2013.
Estimado Luis Paulo
A quantas anda? Fiquei feliz em receber sua carta e de saber sobre os novos projetos que almeja colocar em prática. É necessário mesmo não deixar as coisas caírem no vazio. Eu mesmo ando escutando umas coisas e me pego a pensar que vivemos em um mundo “tubo de ensaio”. Cada um com a sua mistura, dentro da sua casa laboratório.  É estranho. Seja porque nunca fomos tantos (mais de sete bilhões de bocas). Seja porque nunca encontramos tanta facilidade em falarmos uns com os outros. Bem que você dizia: “não se conhece o sabor da fruta olhando para a sua casca”. Do mundo só sabe quem vive nele. Dentro dele.
Conto um acontecido, fato que escutei hoje mesmo. É coisa pequena, ligeireza, não mais do que vinte, trinta linhas.
Fui comprar algumas coisas no mercado. Sai com um livro nas mãos. É que é em dia de feira metade mais um da cidade está caminhando entre as gôndolas do mercado, analisando preços, discutindo coisas tantas. Pensei: “a paciência é a virtude do cliente de hipermercado em dia de preços reduzidos”.
Mas então algo surpreendente ocorreu. Não havia quase ninguém, ninguém mesmo. Era visível que até as atendentes dos caixas esperavam clientes chegarem com seus carrinhos abarrotados de compras. Dei-me ao luxo de caminhar um pouco além do previsto pelos corredores daquele mundo de produtos. E pensei “nem vou precisar abrir o livro”. E, de fato, não precisei. Coisa estranha.
Aproximei-me de um caixa, coloquei as compras sobre a esteira e dei início a uma conversa com a moça que iria me atender. De pronto, indaguei a funcionária...
- Nossa, está tão vazio aqui hoje. Há algum motivo?
- Tem não. Tem dia que enche, tem dia que não vem ninguém. Parece que as pessoas combinam.
- É, parece mesmo. Mas eu nunca peguei o mercado assim. Sempre vim e me deparei com filas consideráveis.
- Ah, tem dia que é assim mesmo. Tem gente que vem quase todos os dias, praticamente nos mesmos horários.
- Sério? – perguntei curioso – Qual seria a razão?
- Ah, tem gente que vem tomar café, outros contar sobre a vida. Um mesmo vem paquerar... É a solidão, né?!
- Paquerar?
- Isso mesmo. Certa vez indaguei um senhor do por que dele vir todos os dias ao mercado. Às vezes, ele comprava um salgadinho e ia embora. E ele, de pronto, respondeu: “venho paquerar!”.
Sabe Luís, sai do mercado pensando na história desse senhor. Realmente, vivemos tempos diferentes. Gente precisa ver gente. Sempre foi assim. Só que hoje em dia a praça é o mercado lotado. Antes, era banquinho na frente de casa, dedo de prosa com o vizinho. Hoje é mais porta fechada. É desalinho.  
Mas que a gente tem o costume de ser só a gente quando enxerga o outro, isso é verdade. Nem dá para mudar. Que graça tem em ser palmeira sozinha em uma ilha no meio do oceano? 
Terminei a conversa com a simpática moça, pus as minhas coisas na sacola e segui rapidamente para casa. E me pus a pensar: “nem sabia que o hipermercado vendia antídoto para a solidão”. Coisa estranha, não é mesmo? É o mundo de hoje. Mundo Solidão!
Abraços e votos de felicidade e saúde,

P.

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