Os caminhos que percorro são como letras de um texto que
parece ter sido escrito há tempos. Visito os verbos, rearrumo o sujeito, e nem
por isso é pretérito. Nem mais do que perfeito. É a vida. E a vida tem cheiro.
Hoje os meus passos me levaram ao encontro de um cheiro
tão meu, da minha meninice, do tempo em que o verde era espaço e não pedaço. Onde
o quintal era extensão, não ilusão. Em uma confusão de ontem e hoje, goiabas
nos galhos das árvores e no chão. Em meio ao chiado do trem, o ronronar das
feras de metal, como se um pote da geleia mais gostosa que alguém poderia ter
feito estivesse aberto. E tão perto! Eu quis escrever!
Todo jardim é um manifesto, pedaço de sonho em um mundo
concreto. As árvores são beatas certezas diante de uma constante crueza. De um
mundo que se acinzenta, das pessoas que se esquecem de que a gente é fruta na
árvore, esperando o dia da colheita.
E aquele cheiro quase que me fez chorar. Porque ninguém
tem compromisso em ver que entre a grade e o trem, o trabalho e o asfalto,
existe um pedaço que grita... Grita e cheira: vida!
Se bem pudesse, tomaria o cheiro para mim. Guardaria como
uma moeda da sorte. Em meio a esse concreto morte, pedaço verde apareceu. E as
árvores todas cheias de cor e cheiro, de fruta, outrora flor. É, Deus existe
sim. E aparece nos pedaços onde o orar é silêncio. O ciclo delicioso. Do
rebento broto, do fruto, do gosto. Adiante tem a estação!
E a fruta cai no chão. E o pássaro come. E a minha
saudade mata a fome do quintal da casa dos meus pais. E das ruas por onde
normalmente não ando mais. E no meio desses milhões, encontrei um pedaço que é
mais. Meu demais.
Um cheiro que molha a boca da memória. Que me faz reviver
histórias. Que me faz lembrar que a gente também é fruta nessa vida. E que as
sementes dessas glórias, tomadas nos percalços de um mundo inodoro, são como
encontros de uma história que é divina por estar no seu estado mais simplório.
Desses pés que se ajeitam e nos lembram, mesmo que por um
momento, que a gente pode até ser outro alguém. Mas sempre seremos aquilo que
nos faz bem.
Sempre!
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